Certa vez, em um reino distante, uma pessoa encrencada e cheia de dúvidas procurou um advogado para resolver seu problema.

Conversaram durante horas, trocaram mensagens sobre leis, contratos e processos por dias, meses, anos. O problema finalmente foi resolvido com uma linda e longa sentença judicial. A pessoa — que era bem inteligente — não entendeu nada, mas o advogado disse que aquilo era bom. Ela estava feliz por ter se livrado do problema mas não se conformava por não conseguir interpretar sozinha o que a lei, os contratos, os juízes e os advogados diziam. Essa pessoa trabalhava com design. Design centrado no usuário. Então ela pensou: As informações legais seriam mais claras se o direito aplicasse alguns princípios de design.

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Essa é uma história inventada, mas o Legal Design poderia ter nascido assim. O direito é feito de problemas. O design possui metodologias perfeitas para transformar problemas em produtos e serviços úteis. Tudo a ver, não?

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O fato é que essa mistura funciona e vem mudando a forma de comunicar e resolver problemas jurídicos. Hoje a principal referência acadêmica é o Legal Design Lab, da Universidade de Stanford, com a professora Margaret Hagan.

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“ Legal design é uma proposta inovadora: olhar o sistema legal a partir dos seres humanos, entender as questões cruciais do sistema e buscar soluções criativas para melhorá-lo. Significa priorizar os usuários do sistema legal — tanto os que estão excluídos e precisam resolver seus problemas quanto os ‘profissionais’ que trabalham dentro dele. A perspectiva do legal design faz com que possamos falar com essas pessoas, co-criar e testar com elas — e gerar algo que efetivamente resolva problemas da forma mais útil, usável e capaz de gerar engajamento. Legal design nos ajuda a fazer pequenas mudanças em grandes processos. Você pode usá-lo para aprimorar documentos legais, produtos, serviços, políticas ou organizações. Utilizar estratégias criativas centradas no ser humano para encontrar maneiras de servir melhor as pessoas.” Margaret Hagan — Legal Design Lab

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Legal Design é mais uma atitude que um conceito.

Acontece quando um grupo de pessoas cria uma solução para o problema jurídico de outras pessoas partindo da visão de quem tem o problema. Depois, fazem testes para ver se funciona e mudam o que for preciso, até que a solução seja aprovada por quem vai usá-la.

Reparou que começa e termina nas pessoas?

Pode ser um novo formato de contrato, um jeito diferente de recorrer de uma multa de trânsito, de apresentar provas ao juiz ou de explicar leis complexas aos cidadãos. Fazer Legal Design é oferecer soluções jurídicas conforme a necessidade das pessoas, em um formato que elas entendem. A clareza gera engajamento e efetividade.

Legal Design é mais um caminho que uma disciplina e se baseia nos princípios de design de interação e design de serviço, além de utilizar métodos centradas no usuário. O mais conhecido é o design thinking que envolve pesquisa, ideação, prototipação e testes.

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À primeira vista muitos imaginam que Legal Design é sobre estética

Sim, é importante criar documentos e sites jurídicos bonitos e organizados.

Sim, o design gráfico e o pensamento visual ajudam muito na hora de comunicar conceitos complexos

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…mas Legal Design é bem mais que isso.

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É provável que você já tenho feito design centrado no usuário, intuitivamente, sem perceber. Porque é um mecanismo que nasce da empatia, de olhar para a dor do outro e querer resolver algo que o incomoda. A maior dificuldade porém está em transformar esse olhar em um produto final, uma entrega. Daí a importância dos princípios de design, de trabalhar de forma ordenada até chegar a um produto.

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Usuário é a mesma coisa que cliente?

Na maioria das vezes sim, mas nem sempre. Usuário é a pessoa que precisa da solução jurídica, quem literalmente vai usá-la.

O que é preciso para fazer Legal Design?

1) Um problema, uma dor, com recorte bem definido

2) Um grupo multidisciplinar que trabalhe em equipe, esteja disposto a pesquisar e levar a sério os resultados das pesquisas, deixar crenças pessoais de lado e cocriar protótipos das soluções jurídicas

3) Testar com o usuário cada solução proposta, ouvir e perceber as suas dificuldades e necessidades diante da solução

4) Ficar o tempo todo junto do usuário, observar e mudar o que for preciso

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Preciso contratar um especialista em Legal Design?

Legal Design é uma mentalidade que se desenvolve praticando em equipes multidisciplinares. E um dos maiores desafios é ensinar grupos de advogados a trabalhar de forma colaborativa entre si e com profissionais de outras áreas.

O direito vem de uma tradição hierárquica — os sócios de um escritório não estão acostumados a criar soluções em parceria com os estagiários. Chamar um consultor ou facilitador para aplicar as metodologias e conduzir as sessões é sempre uma boa idéia. Esse profissional vai guiar as equipes em um processo gradativo. Os especialistas surgirão naturalmente à medida que forem estudando, exercitando e entendendo o processo. No fim das contas Legal Design é uma chavinha que vira dentro da cabeça da gente. Quando você incorpora esse jeito de pensar é um caminho sem volta.

Algumas das soluções mais admiradas nasceram de empresas que possuem a cultura do usuário no DNA. Onde cada profissional, independente da especialidade, cria e testa pensando no usuário, o tempo todo. Se isso faz sentido para você, experimente.

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• Sou advogada e passei quase duas décadas em jurídicos de empresas multinacionais. Parte da minha rotina era "traduzir" o direito para as outras áreas da empresa e explicar o sistema legal brasileiro para estrangeiros. Em 2018 comecei uma pós-graduação em design de interação e graças à paciência dos meus colegas e professores designers estou incorporando as habilidades de design à minha experiência jurídica (sou a única advogada da turma). Adoro o que faço e acredito cada vez mais no casamento do design com o direito. https://www.linkedin.com/in/ana-paula-ulandowski-holtz-07a48b31/
• Esse artigo nasceu da cara de espanto das pessoas quando digo que trabalho com legal design. Sim — ainda — é diferente, parece estranho, é possível e funciona. E foi inspirado pelo artigo “Legal Design, WTF?” https://www.legalgeek.co/learn/legal-design-wtf/
• O Legal Design Lab da Universidade de Stanford disponibiliza material precioso, gratuitamente. https://law.stanford.edu/organizations/pages/legal-design-lab/
• Se você curtiu as duas referências anteriores, vá em frente, o bichinho do legal design já te mordeu.
• Crédito da ilustração: Mariana Betiol https://mholtz.myportfolio.com/animation

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